O disparo da arma provocou em mim um susto tão grande quanto ao susto que provocou no Neguinho, que deu um salto ao mesmo tempo que espanava o pé , crente que fora atingido.Na verdade, os chumbinhos da velha espingarda atingiram o chão, bem perto dos pés do menino que seguia pela trilha , na minha frente. O acidente que quase provocou uma tragédia, aconteceu minutos depois de uma caçada frustrada a um Nambu. A ave que tem hábitos rasteiro, atravessou a trilha bem a nossa frente e se enfiou debaixo das folhagens secas. Pedi a Kelé que cercasse do outro lado, armei a espingarda e vasculhei palmo a palmo toda a área. Em vão, o bicho sumiu. certamente passou pelo meu desatento escudeiro e desapareceu no mato. Paciência. Aí, seguimos pela trilha com o menino na frente de repente... bunnn!!! O caso é que esse caçador amador, além de perder a caça, se esqueceu de desarmar a espingarda e um garrancho qualquer acionou o gatilho e quase matei o menino.
Esse causo aconteceu a cerca de sessenta anos atrás e somente hoje resolvi relatar essa e outras historinhas passadas em Santa Justa. Ao chamar o menino de neguinho, não quis de forma alguma manisfestar preconceito. Neguinho era um dos apelidos de Clementino, um garoto negro adotado por minha mãe quando ainda era um bebê. Vale lembrar que meu próprio pai ostentou durante os seus 96 anos de vida o apelido de Zé Pretinho, uma saga que já ultrapassou 4 gerações.
A sessenta anos, quando se referia a Santa justa, logo se lembrava 3 íncones da família Vieira: Abraão Vieira, Cipriano Vieira e Vicente Vieira. Minha mãe, Maria Vieira ficou conhecida apenas como Maria de Zé Pretinho, não que meu pai tivesse algum brasão de família, apenas porque esse apelido figurou durante quase um século entre os cidadãos mais respeitados de Santa Justa. Até hoje em dia, quando nasce um bebê na família, é costume se dizer que nasceu mais um pretinho.
Pesquisando, não encontrei nenhum registro que ligue o nome Santa Justa com algum seguimento religioso. No papai google, consta apenas uma anotação que diz que esse era o nome de uma antiga freguesia portuguesa na região de Lisboa ( freguesia são as menores divisões administrativas em Portugal, equivalente talvez às sub-prefeituras das grandes cidades do Brasil como São Paulo). E porque alguém foi se dar ao trabalho de botar esse nome naquelas quebradas da Região do Mangaí?
Possivelmente algum desbravador lusitano achou por bem homenagear sua saudosa Santa Justa portuguesa. Confesso que inventei essa, não posso dar crédito as minha próprias conjecturas, mas que seja assim até que alguém venha me corrigir.
Os causos passados em Santa Justa são todos verdadeiros. Todos os lugares ainda estão por lá, as grotas, as capoeiras, o velho Rio Mangaí e suas artérias. Os personagens não estão mais pois todos os velhos,Deus os levou e os jovens quem os levou foi o destino. Não somos muito fiéis as nossas raízes e sempre acreditamos que o "pote de ouro" está mesmo do outro lado do Arco Íris. Felizmente podemos ser fiéis as nossas memórias e quando bate a saudade, voltamos, ainda que em pensamentos. Nesse momento, meus pensamentos estão voltados para lugares como GAMELEIRA, GARIROBA, ESPÍRITO SANTO e alguns redutos de maior intimidade como POÇO DA MACAMBIRA, BOQUEIRÃO, TAMBORIL e muitos outros lugares de Santa Justa, distrito rural do município de São Francisco - MG
Minha intensão é escrever um livro sobre SANTA JUSTA, por enquanto ficamos no PREFÁCIO.